“Imprevistos Acontecem”

“Imprevistos Acontecem”

Relendo a notícia publicada no jornal local, optei por escrever o que ocorrera. A notícia dizia: Avião não consegue aterrissar no aeroporto de Foz do Iguaçu e pousa em Maringá. O imprevisto foi registrado na tarde de sábado, 20 de abril de 2019, devido às condições climáticas na fronteira (Portal da Cidade, 2019).

Um avião da Gol Linhas Aéreas Inteligentes que saiu de São Paulo (SP) com destino à Foz do Iguaçu, região Oeste do Paraná, não conseguiu aterrissar no Aeroporto Cataratas na tarde de sábado (20). O imprevisto foi devido às condições climáticas na fronteira, o avião que saiu às 15h50 e tinha chegada prevista para 17h30 em Foz do Iguaçu teve que pousar em Maringá, cerca de 414 km de distância. 20 de abril de 2019.

A previsão de tempestade e ventos fortes levou ao adiamento do vôo, portanto, remarquei a data de retorno à João Pessoa, após ter ficado 15 dias no CEAEC. O fato é que, simultaneamente, também ocorreu uma tempestade intraconsciencial em mim.   

Havia permanecido no bairro Cognópolis por 15 dias participando de imersão no balneário energético em cursos, laboratórios, dinâmicas e atividades consciencioterápicas. Durante aquele período de permanência no CEAEC a meta era de aprofundar a autopesquisa, buscando a identificação das reciclagens intraconscienciais. Meu entendimento era que havia várias situações para reciclar, refazer, reorganizar e planejar ações para reajustes da vida intrafísica. Com a intenção e vontade de avançar no processo evolutivo o objetivo central era o de realizar reciclagens intraconscienciais visando qualificar a prática da Tenepes, que até então percebia certa estagnação.

O fato de o clima ter provocado o cancelamento da viagem desencadeou em mim vários pensenes. Meu pensamento e sentimento eram de que nada acontece ao acaso e refleti qual seria o aprendizado e a mensagem subliminar por trás do imprevisto. As reflexões me deixaram absorta em diversos pensamentos e sentimentos que me afligiam e interferiam na manifestação energética somática. Fatos e parafatos do passado obnubilavam a mente com questionamentos. 

A questão mais intensa que repercutiu em mim era o fato de precisar ser acolhida durante o tempo de suspensão do vôo e a opção da empresa era embarcar às 4h50 para São Paulo, pernoitar lá e aguardar remarcação, a outra seria remarcar para 2 dias, a empresa não ofereceu hospedagem em Foz. Era noite, o CEAEC foi descartado por estar fechado devido ao horário e minha opção era a residência de uma pessoa da família. E essa perspectiva familiar desencadeou um turbilhão na minha intraconsciencialidade, emergindo a condição de ‘pedinte’ específica da mesologia nordestina, local da minha ressoma nesta seriexis. 

Souza (2017, p. 79-80) explica que o ‘pedinte nordestino’ já foi cantado por Luiz Gonzaga, na canção Vozes da Seca, retratando “o sujeito nordestino pobre, pedinte de esmola, ignorante, conformado […]”. Em prosa e verso, o contexto cultural do nordeste brasileiro foi referência para as artes e a literatura. Caracterizado pela falta de indústrias, com uma condição econômica baixíssima, sendo considerado um estado inferior, local de penúria e miserabilidade, cristalizou “uma espécie de arquivo cultural de nordeste subdesenvolvido e ignorante”. E esse estigma pesou na minha intrafisicalidade, fez prevalecer o trafar do meu local de ressoma naquele momento de tomada decisão, ao solicitar ajuda. 

No turbilhão do meu interior intraconsciencial, me autoquestionava: Por que aflorou aquele sentimento de estar na situação de “pedinte retirante nordestina”? O que me bloqueava para ligar e pedir “guarida”? 

Minha história de vida repassava na memória e lembrei da infância onde não sabia como seria o dia seguinte. As carências de moradia, alimento e afeto afloravam como um turbilhão. Lentamente fui acalmando a mente, procurei raciocinar e utilizar o mentalsoma. Havia registrado um dos meus traços faltantes (trafal) a ser reciclado, qual seja, o de achar de ser humilhante precisar de alguém. Acoplado a esse modo de pensar estava o comportamento social de agradar as pessoas sendo “boazinha” e dizendo “sim”, quando, na verdade, pensava o contrário. Essas reflexões me levaram a ouvir a “voz mentalsomática” e perceber que o acontecimento imprevisto era parte da autoreciclagem que necessitava fazer. Segundo Vicenzi (2011, p.107): 

O equívoco do pensamento derrotista gerado pela autoculpa está no fato de não podermos mudar o nosso passado e nem eliminar os erros já cometidos. A única utilidade prática do passado é a possibilidade de aprendermos com ele. De toda situação vivenciada, vale mais extrairmos o lado mais positivo, isto é, as lições proporcionadas. É desta forma que adquirimos discernimento e amadurecemos.

 

Após os encaminhamentos no guichê da empresa aérea, descartei a possibilidade de passar a noite sentada nos bancos do aeroporto e munida das reflexões acerca da autoreciclagem tomei atitude e liguei para uma parente habitante em Foz do Iguaçu. Perguntei se poderia me acolher em sua residência e com o consentimento tomei um taxi e fui para o local, onde fui bem acolhida. A forte chuva, os relâmpagos nunca vistos por mim, mesmo temerosos, eram como aplausos pela minha autoreciclagem, desdramatizando os acontecimentos e encarando a realidade como oportunidade de crescimento e amadurecimento.  

Na manhã seguinte, dia 21 de abril de 2019, fui para o CEAEC almoçar e ir no Tertuliarium assistir ao verbete.  Após o término da defesa do verbete senti forte energia na minha psicosfera e não senti vontade de sair dali. Ocorreu que ao sair daquele ambiente energizado percebi uma sensação de melancolia e com a parapercepção de já ter vivido em ambiente e situação similar àquele.

No decorrer das horas, após as vivências e energizações, pude ter clareza dos seguintes aprendizados:  (1) iniciar o processo de perdão intraconsciencial; (2) revisitar os traumas da infância mal resolvidos e que emergiram fortemente naquele ambiente e período; (3) ressignificar os traumas culturais assimilados; (4) liberar os fatos guardados, contidos, os quais eclodiam internamente como mágoas, patopesenes e ruminações; e (5) manter a ortopensenidade sadia, descartando aquelas lincadas com a infância e as vivências traumáticas não superadas até aquele momento.

Rememorei as palavras de que o perdão liberta, desata e libera a conscin. O sentimento de desatar os “nós” e iniciando novo patamar. Na prática acontece lentamente, porque funciona como um boomerang quando não totalmente resolvido, ou seja, retornam com os fatos ruminados, não superados e as situações que reproduzem automimeses dos traumas impregnados no psicossoma da consciência, queloides adquiridos na mesologia da infância.

A retomada da viagem marcada pela empresa para a madrugada do dia 22 de abril de 2019, levou-me a refletir que necessitava daquele acréscimo de dias no CEAEC. O imprevisto foi positivo e se transformou em oportunidade de autoreciclagem. O amparo mostrou minha pensenidade do momento presente voltada para os traumas do passado interferindo no entendimento dos pensenes atuais, de modo a prejudicar o discernimento por meio da distorção das percepções e paraperceções dos acontecimentos. 

 A pensenidade do momento presente fluía por meio das mágoas e traumas que vieram à tona durante o processo da autoconscencioterapia, realizada na Organização Internacional de Consciencioterapia (OIC). Muito recentes, esses resíduos conscienciais ampliaram a instabilidade emocional e a memória mesológica de ressoma.  

Essas reflexões sobre como uma situação inesperada pode desencadear margem para a ressignificação de traumas passados, como por exemplo: uma pessoa andando e tropeça numa pedra. O normal e conveniente seria ficar chateada com a dor da topada, mas se permitir refletir do “porquê” tropeçou na pedra, o que é a pedra e o que essa dor provoca e te faz sentir. Estes autoquestionamentos permitem enxergar a situação com mais clareza e aprender mais sobre si. Foi o que esse solilóquio me reportou à autopesquisa e às reflexões acerca das vivências que surgem de maneira inesperadas. Ter esse entendimento foi libertador e contribui para ficar atenta aos acontecimentos intrafísicos e extrafísicos e qual o aprendizado se pode tirar dos imprevistos, sem perder o foco no processo evolutivo. A manutenção da ortopensenidade é exercício de reflexão diária, lembrando a importância de ser minipeça no maximecanismo interassistencial. 

O processo de descarte via compreensão dos fatos continua até hoje, tendo em vista que ainda tenho muito a reciclar. A autopesquisa vai gradativamente descortinando os nós górdios que impedem e estagnam o processo evolutivo. Constatei que são necessárias não só a vontade e a intenção, mas as ferramentas necessárias para avançar, planejando, compreendendo que as dificuldades existem e que mesmo estando ligadas ao passado é possível mudar e melhorar. 

É essencial a resiliência no processo autopesquisístico e a postura da interassistência. Nesse sentido, um dos aportes mais significativos é a técnica da prática da tenepes. Esta técnica propicia à conscin, a possibilidade de melhorar o padrão pensênico derrotista, estagnado e avançar no processo evolutivo dia a dia, onde tenho a oportunidade de vivenciar o paradigma consciencial, mesmo com todas as peculiaridades inerentes à natureza humana, ou seja, errando, refletindo e ressignificando os fatos e parafatos.

Agradeço aos amparadores pela oportunidade de ter tido acesso a Conscienciologia, conviver e compartilhar com as outras conscins nessa dimensão intrafísica, não obstante as adversidades e diversidades entre os pares, focando mais nos trafores, a fim de não perder o foco na evolução grupal.

 Referências:

1. Portal da Cidade. Avião não consegue aterrissar no aeroporto de Foz do Iguaçu e pousa em Maringá. Acesso em: <https://foz.portaldacidade.com/noticias/cidade/aviao-nao-consegue-aterrissar-no-aeroporto-de-foz-do-iguacu-e-pousa-em-maringa>.

2. Sousa, Sandro Luís de. A canção “Vozes da Seca” de Luiz Gonzaga: vozes de protesto sob uma perspectiva da análise do discurso. Acesso em: https://periodicos.ufrn.br/gelne/article/view/11279/8400; Instituto Federal do Rio Grande do Norte; Revista do GELNE, Natal/RN, Vol. 19, Número 1, p. 79 -88. jan-jun. 2017.

3. Vicenzi, Luciano. Coragem para evoluir – Editares – 3ª Ed. 2011 – p.107.

4. Antunes, Eliene – Relato – XVII Fórum da Tenepes, Revista Conscientia – Vol.25 – N.4-Out./dez. 2021 – Interação Autopesquisa-Tenepes: Desenvolvimento de Posturas Evolutivas – p.707.

Autora

Eliene Antunes Cavalcante

Pedagoga, Especialista em Educação em Direitos Humanos, Voluntária da Associação Internacional de Tenepessologia (IC TENEPES).

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